No Brasil, o conflito entre Rússia e Ucrânia tem maior impacto no que tange aos fertilizantes e ao milho
O conflito entre Rússia e Ucrânia já causa reflexos na economia brasileira, impactando principalmente o agronegócio. A Rússia é a maior fornecedora de fertilizantes do Brasil e a Ucrânia se destaca na produção de milho, mundialmente. Portanto, uma possível retirada do país do mercado internacional, certamente acarretará alta nos preços do grão de forma global. Na prática, a importação de fertilizantes do Leste Europeu e insumos agrícolas deve ficar comprometida com a invasão russa às terras ucranianas. Atualmente, estes itens estão no topo da lista de produtos importados pelo Brasil.
Mesmo geograficamente distante, os impactos da guerra da Rússia contra a Ucrânia vão trazer consequências que, mais cedo ou mais tarde, chegarão no bolso e na mesa de várias pessoas ao redor do Globo, mas em especial na dos brasileiros. E no que diz respeito aos impactos econômicos, por enquanto, o agronegócio é o mais impactado. Atualmente, o Brasil importa 90% dos fertilizantes usados em diferentes tipos de culturas agrícolas e uma parte significativa vem da região em que ocorrem os conflitos ou, passa por portos que não estão conseguindo escoar a produção.
Agricultura 4.0: a virtualidade chega ao campo
Em entrevista à Revista Exame, Guilherme Bellotti, gerente da consultoria Agro-Itaú BBA, afirma que a forte pressão de custos turbinada pelo conflito, irá afetar as margens de ganho dos agricultores na safra 2022/2023, que começa a ser plantada a partir de outubro deste ano. Elas devem ser menores do que as registradas na safra 2021/2022. “A rentabilidade deverá ser menor, a menos que tenha um impulso muito grande nos preços das commodities”, disse o analista.
Ao depender basicamente dos fertilizantes importados da Rússia, uma vez que é a maior fornecedora do insumo, para o Brasil, a tendência é que haja uma elevação no produto que conseguir chegar. Além disso, o país europeu compra commodities e carnes do Brasil. Na visão somente de produtos agropecuários, a Rússia ficou na 22ª posição dentre os maiores importadores, com US $1,27 bilhão adquiridos em 2021 (participação de 1,06%), segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Milho e fertilizantes são itens que mais perdem, no agro, com a guerra entre Rússia e Ucrânia
A Ucrânia, por sua vez, é líder na produção de milho. Uma possível retirada do país do mercado internacional, diminuiria a oferta do cultivo, provocando uma alta no preço do grão, que é muito usado como ração, aumentando, assim, os custos de produção na pecuária e das carnes nas prateleiras.
Os fertilizantes químicos funcionam como um tipo de adubo, usados para preparar e estimular a terra para o plantio. Antes mesmo do conflito, o mundo já enfrentava uma crise no setor devido ao custo elevado dos preços e à escassez no mercado. Os principais motivos eram problemas energéticos em países fornecedores da matéria-prima para esses produtos, como China, Rússia e Índia, e problemas logísticos por causa da falta de contêineres e navios.
Agora isso pode se estender ou até mesmo piorar. Isso porque, no mercado mundial, a Rússia domina 10% dos nitrogenados, 7% dos fosfatados e 20% dos potássicos
A soja, por exemplo, principal commodity do Brasil, depende muito do fósforo e do potássio. Em possível impacto desses produtos, até as rações para a pecuária seriam afetadas, por sua vez, elevando o custo de produção das carnes e o valor para o consumidor.
O Brasil importa em média US$ 5,7 bilhões em produtos da Rússia, 65% em fertilizantes, e exporta US$ 1,6 bilhão em outros produtos. Pelo menos 20% disso é soja.
Alta dos preços vão se refletir em inúmeros itens, com a guerra da Rússia com a Ucrânia
Essa dependência da agricultura brasileira e seu efeito cascata impactam as rações dos animais e o preço das carnes, que já sofrem com a alta da inflação — conforme o último boletim Focus do Banco Central, deve chegar a 5,56%.
Para a consultoria Agroconsult, especializada no agronegócio brasileiro, não há dúvida de que o Brasil sofrerá muito com a repercussão da guerra. Mesmo sendo a importação direta da Rússia ou da Ucrânia (respectivamente o primeiro e o quarto maiores exportadores mundiais) não tão relevante, o Brasil sentirá o efeito da alta nos preços. “Os preços internacionais já subiram 20% desde o início do ano e tendem a subir ainda mais com o conflito”, afirmam.
Petróleo
A tudo isso se junta o preço dos combustíveis, que tem impacto direto e indireto na inflação. Logo após o início da invasão russa, o barril do petróleo chegou a passar dos US$ 105. O dólar, que tende a se fortalecer, também deve pressionar os preços. Embora não seja o que está ocorrendo no momento, o mercado reage de acordo com a expectativa, e elas não são nada boas.
Afinal, embora a Petrobras, segundo os especialistas, tenha buscado paridade internacional para seus preços, e que outros supridores compram gás no exterior para atender contratos no mercado brasileiro. Essa situação de novos reajustes neste ano pode intensificar os problemas políticos e econômicos que a escalada nos preços do gás e dos combustíveis tem provocado no País.
Uso racional será a única saída
Evidente, que a alternativa imediata que os produtores terão de buscar, caso a guerra se prolongue, será uso racional de fertilizantes, utilização de ferramentas de agricultura de precisão, substituição por biofertilizantes, adoção de práticas de agricultura regenerativa e rotação de culturas com foco na melhoria da qualidade do solo.
Mesmo que o mundo se volte ao Brasil e outros países produtores, não há terra o suficiente para atender a todos em um, eventual, desabastecimento mundial, e isso gera alta nos preços.
No geral, as guerras tendem a gerar protecionismo e perda de produção. A grande questão deste conflito não é apenas a Ucrânia, mas as grandes potências envolvidas, Rússia e EUA. Isso afeta também a confiança do mercado. A invasão ocorre onde o trigo de inverno está plantado na Ucrânia, e com conflitos bélicos se intensificando na região, tendem a impactar a oferta do cereal do país.
Segundo o banco de investimentos, a disponibilidade internacional para as commodities de trigo e milho já era limitada e esse eventual bloqueio das vendas externas, por sanções ou por problemas logísticos, pode sustentar ou até elevar mais ainda os elevados patamares de preços.
Soja também será afetada a longo prazo com a guerra da Rússia com a Ucrânia
As altas dos preços de trigo e milho podem impactar no preço da soja, mesmo Rússia e Ucrânia não sendo relevantes produtores da oleaginosa. Tais commodities competem entre si no que diz respeito à alocação de área a ser plantada e são substitutos nas rações.
Mesmo com a safrinha de milho garantida no Brasil, há risco de uma escalada de preços. Isso porque a Ucrânia é um grande produtor de milho e, por conta das condições climáticas, o calendário de plantio é muito reduzido no país.
Eles estão com outro problema porque boa parte da lavoura que vem da Ucrânia depende do capital estrangeiro. O mercado não sabe se vai ter investimento e se o país vai conseguir colher. A Ucrânia também tem participação importante na produção de cevada, girassol e trigo.
Tradicionalmente, a safra de milho no Brasil é voltada para o mercado interno. Mas com menos oferta, o preço sobe, e o produtor vai preferir exportar. A safra de milho traz impactos na avicultura e na suinocultura. Não é de imediato que o reflexo chega nas gôndolas do supermercado, mas ele virá.
Conflito afeta safra de milho e petróleo
A influência do conflito começa pelos fertilizantes, que já iniciaram sua escalada no final de 2021, quando uma crise na Bielorrússia – um pequeno país do Leste europeu, mas responsável pela produção de um quarto do volume mundial de cloreto de potássio – fez com que os preços do produto mais que triplicaram no ano passado. O movimento, já naquela época, causou preocupações, principalmente, para a segunda safra de milho este ano.
A Rússia, além de grande exportador, também é uma das poucas origens de potássio no mundo, além de fornecer em larga escala para as lavouras do mundo também os outros dois macronutrientes essenciais, nitrogênio e fósforo. A forte alta dos contratos futuros de fertilizantes na Bolsa de Chicago indica o temor em relação à indisponibilidade dos insumos
Rússia pode ser afetada como exportadora de várias commodities
A Rússia é um grande exportador de commodities como petróleo, gás natural, trigo, milho e fertilizantes. E o seu ataque à Ucrânia causou uma disparada no preço do petróleo e gás natural nas bolsas mundiais, refletindo no frete internacional, uma das variáveis na composição do custo dos produtos agrícolas. O mercado também segue apreensivo, pois regiões como a União Europeia e os EUA já anunciaram sanções contra a Rússia que podem afetar a disponibilidade de petróleo e gás natural.
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